segunda-feira, 12 de julho de 2010

Fantásticas páginas sangrentas

Há quem duvide que os livros são portas de acesso a qualquer lugar deste ou de outro mundo. Provavelmente essas pessoas ainda não experimentaram a sensação de explorar o desconhecido através da leitura. Nesse caso, uma boa pedida é O nome da morte de Klester Cavalcanti. Além de passar uns dias às margens do Rio Tocantins, o leitor é convidado a acompanhar a história de Júlio Santana, o homem que matou 492 pessoas. Como nas grandes obras literárias, o autor utiliza os benefícios da descrição com maestria e, dessa forma, transmite alegria, tristeza, dúvidas e medo. Como negar que se ouve o disparo de espingarda na primeira morte? Como não compartilhar dos medos e receios de um assassino?

“Julão” tinha apenas 17 anos quando foi induzido pelo tio a se tornar um matador de aluguel. Aparentemente a “profissão” lhe oferecia um futuro melhor, ou ainda, um escape da comunidade pobre onde vivia. O remorso após a primeira morte teria impedido o jovem de trilhar esse caminho, se não fosse o refrigério que sentia após rezar dez “ave-marias” e vinte “pai-nossos”. Como bom conhecedor da vida na mata, também trabalhou guiando o Exército na captura de comunistas às margens do Rio Araguaia. Ver a maneira como as autoridades realizavam as torturas fez com que enxergasse a morte com naturalidade e sentisse prazer em ter nas mãos o poder sobre a vida do outro.

Em O nome da morte, o leitor coloca à prova seus conceitos sobre violência e duvida dos sentimentos pelo protagonista da história. Passa a enxergar os criminosos como pessoas comuns, dessas que têm um coração batendo no peito. É estimulado a uma reflexão profunda sobre a importância da educação na formação do ser humano e tem o privilégio de experimentar a ação transformadora que um bom livro oferece. Klester Cavalcanti utiliza um vocabulário atraente e, ao mesmo tempo, agradável de ler. Ingrediente já consagrado em sua obra anterior, Viúvas da terra, vencedora do Prêmio Jabuti em 1995.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Origem e Importância das Profissões

A importância de ter uma profissão surgiu a medida que o homem passou a viver em sociedade. A princípio, tratava-se apenas de uma preocupação em dividir as tarefas. Dessa forma, ao longo dos séculos, profissões apareceram e desapareceram de acordo com as necessidades. Segundo a psicóloga Maria Elci Spaccaquerch (2009), o desenvolvimento da sociedade ampliou as opções profissionais, mas o direito, a engenharia e a medicina continuam sendo as de maior prestígio. Ela diz ainda que muitos jovens acabam optando sem vontade por uma destas profissões pelo fato de ser valorizada pelos pais. Isto ocorre com frequência, ocultando talentos que poderiam ser desenvolvidos em outras áreas (SALSEIRO, 2010).

O bacharel em direito Jonas Mello Pinho, em entrevista pessoal, diz que a advocacia surgiu quando o homem percebeu que a vida em sociedade precisava de regras. Porém, essas regras deveriam nascer com base em princípios. Atualmente, um bacharel só se torna advogado prestando uma prova para a Ordem dos Advogados do Brasil – OAB. O exame é bastante complexo e existe um alto índice de reprovação.

Em relação aos engenheiros, o jornal Folha de São Paulo publicou em 21 de junho de 2008 que os primeiros chegaram ao país por volta de 1792. Eles tinham a missão de ensinar ciências, matemática e artilharia. Em dezembro de 2006, o Jornal do Engenheiro publicou uma matéria que abordava a importância dessa profissão. Um dos entrevistados foi o vice-reitor da Universidade Veiga de Almeida (UVA) do Rio de Janeiro, Luiz Chiganer. Segundo ele, se a engenharia não crescer, o país não desenvolve. O desenvolvimento está ligado à tecnologia e tecnologia é engenharia (FOLHA, 2010).

De acordo com o médico Wilson A. Ribeiro Júnior (2009), a Medicina levou milhares de anos para se constituir como ciência. Desde a Idade da Pedra, o homem procurava descobrir o motivo das diversas moléstias que lhe afligia e, para isso, utilizava plantas medicinais. No Egito Antigo, a doença era considerada uma punição divina. Em alguns casos, tratada com poções mágicas e rituais. Porém, foram os gregos que se destacaram ao estudar os sintomas das doenças. Seu mestre era Hipócrates, considerado o pai da Medicina. Como falado anteriormente, essa profissão continua sendo uma das mais admiradas. Afinal, existe algo mais belo do que salvar vidas? (WARJ, 2010).

Além do valor social dessas profissões, os jovens continuam optando por elas pelo rápido retorno financeiro. Porém, Spaccaquerch lembra que não basta o título. Um bom profissional depende de conhecimento, talento e está ligado à satisfação com o que faz. A pedagoga Francisca Socorro Araújo (2009), ressalta que o desenvolvimento tecnológico acelerado extinguirá muitas profissões, pois elas representam uma peculiaridade de cada momento histórico. Diante desta colocação, passamos a refletir sobre alguns profissionais que vêm resistindo ao tempo na cidade de Urussanga, sul de Santa Catarina. Entre eles, um velho ferreiro e uma simples senhora que conserta sombrinhas (INFOESCOLA, 2010).

Essas profissões mantêm viva uma parte da história da cidade. Em sua maioria, surgiram com as necessidades dos imigrantes e de seus descendentes. Grande parte destes trabalhadores são pessoas que já tem uma idade avançada. Estariam eles passando este legado a outros? Ou este modo de vida estaria condenado a desaparecer? Seria possível nunca mais ouvir os sons gerados por uma roda d’água feita manualmente? Ou ainda, viver em uma sociedade sem alfaiates? Enfim, nossa proposta é de se aventurar em um mundo de sons e cores feito por estes artistas tão especiais da Capital do Bom Vinho.
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domingo, 4 de julho de 2010

Profissão 1: O confeccionador de cestos

Ao longo dos anos, profissões aparecem e desaparecem de acordo com as necessidades. Enquanto a tecnologia caminha “a passos largos”, os valores culturais das atividades mais simples são deixados de lado. Podemos perceber isso na história do confeccionador de cestos, Doralino de Nez. Aos 72 anos, o urussanguense de cabelos grisalhos fala com orgulho do trabalho artesanal que aprendeu com o avô. As marcas do tempo impressas na pele transparecem sua experiência e sabedoria. Durante décadas, ele trançou cipós e taquaras para a confecção de balaios e derlas, o que justifica as mãos calejadas. Animado com a visita, improvisa uma mostra. Reúne os utensílios que ainda guarda. Alguns balaios estão cheios de amendoins, outros cheios de batatas.

A tradição veio da Itália há mais de 100 anos. Como os avós de Doralino trabalhavam com engenho de farinha, precisavam de cestos para auxiliar na colheita da mandioca. Sendo assim, colocaram em prática o conhecimento que possuíam para confeccionar utensílios com taquara. O tempo passou... A atividade foi mantida e apresentada ao pequeno Doralino. O menino mantinha os olhos fixos no avô que cortava a taquara em filetes. Também passou a observar a delicadeza com que esses filetes eram trançados. A admiração pelo trabalho da família motivou Doralino a aprender. Ainda hoje, ele diz que essa atividade é artesanal e, portanto, requer sensibilidade e bom gosto.

Como de costume, Doralino caminhava “mata a dentro” em busca de cipós e taquaras. No caso do balaio, o cipó ideal é o de São João que floresce somente a cada sete anos. Ele é secado no sol e trançado para fazer o fundo e as bordas. Já as laterais são feitas com filetes de taquara. Para facilitar ainda mais a colheita de tubérculos e cereais, foi criado um cesto semelhante ao balaio, onde foram acrescentadas duas alças. Esse ficou conhecido como derla. Bastava colocá-lo nas costas e estocá-lo com milho, mandioca, batata... As alças do derla eram feitas com outro tipo de cipó: o cipó-pau. Esse é mais flexível e também era usado como corda para amarrar o gado.

Embora a confecção de cestos fosse a atividade predileta de Doralino, ele diz que atualmente se torna inviável. Comenta que, nos supermercados são encontrados recipientes plásticos de vários tamanhos e com preços acessíveis. Logo, pergunta: “Por que alguém compraria um balaio por R$60, se uma bacia de R$10 tem a mesma utilidade?”. Lamenta dizer isso, mas prefere encarar a realidade. Costumava confeccionar, em média, 70 cestos por ano. Hoje, essa meta para a venda é praticamente impossível em sua comunidade. Então, continua apenas trabalhando na roça: planta milho, amendoim e fumo. A diferença é que boa parte dos trabalhos que antigamente eram manuais, hoje são automatizados.

Ao olhar para trás, Doralino fica emocionado. A entrevista lhe estimulou a abrir as janelas da memória e, consequentemente, a ter sensações que estavam adormecidas há anos. Enquanto falava da confecção de cestos, lembrava com carinho dos pais e avós. Alguns momentos foram felizes, outros com dificuldade. Conta que, ao trabalhar na roça, levava um porongo cheio de café. O mesmo era tapado com um sabugo de milho e mantinha o calor da bebida. O fato dos anos terem passado, não é o bastante para que esqueça o aroma do café forte e quente que a mãe fazia. “Isso era o que aquecia e despertava os colonos nas manhãs frias de inverno. Daquelas em que as pastagens ficam brancas de geada”, acrescenta.


Profissão 2: O ferreiro

Como vou tirar foto desse jeito? Antes, preciso ir ao ‘salon’ fazer a maquiagem”, são essas as palavras de seu Lírio Folcchini, 97 anos, ao saber que seria entrevistado para esta matéria. Para “não queimar o filme da máquina”, como ele mesmo diz, vai ao banheiro se arrumar e volta dez minutos depois. Preocupado com a aparência, deixou os cabelos grisalhos levemente molhados e escovados para trás. Também trocou a camisa que vestia e calçou sandálias. A casa do ferreiro fica na comunidade de Santo Antonio de Azambuja, no interior de Urussanga. A única estrada que chega até lá é de chão batido, estreita e com muitos buracos. Durante o percurso, é comum dividi-la com tobatas, carros-de-boi e tratores. Porém, dificilmente um automóvel trafega pelo local.

Ainda na infância, seu Lírio teve que encarar grandes dificuldades e superá-las. Em busca de uma oportunidade de emprego, seu pai foi para o Rio Grande do Sul. Lá, começou a trabalhar na estrada de ferro e, de tempos em tempos, vinha visitar a família. Porém, as vindas foram se tornando cada vez mais escassas e acabou abandonando a esposa e os quatro filhos. Sem opção, a mãe foi a responsável pelo sustento das crianças. Trabalhava na “lavora” com os três menores e deixava seu Lírio, na época com sete anos, responsável pelas tarefas domésticas. Ele preparava o almoço e limpava toda a casa. “Isso tudo serviu para eu aprender que devia ajudar minha mãe o quanto podia. Eu dizia para ela que quando fosse adulto, teria uma profissão e ela teria orgulho de me ter como filho”, comenta.

Aos 14 anos, começou a trabalhar na ferraria do senhor Carlos Spillere. Com o sotaque italiano, herdado dos avós que chegaram ao Brasil em 1890, ele fala que se dedicou muito para aprender a atividade. Por este motivo, aos 17 anos já era considerado um profissional da área. A partir daí, nunca mais parou de moldar ferro. Especializou-se na confecção de machado, enxada, “facon”, foice, pá, picareta, além de reparar equipamentos agrícolas, como arados e carpideiras. Comprou a própria ferraria em 1948 e até hoje a mantém em funcionamento. Na época, toda a produção era vendida para a região carbonífera, que estava em franco desenvolvimento. O ferro era adquirido na estrada de ferro Dona Tereza Cristina e na cidade de Laguna.

Apesar de todas as conquistas profissionais, seu Lírio não teve uma vida fácil. Além de ter sido abandonado pelo pai na infância, foi chamado para defender o Brasil na Segunda Guerra Mundial. Sem escolha, deixou a família e a noiva em Urussanga. “Fiquei lá por quase dois anos. Foi tudo muito triste, parecia que nunca ia acabar. Um dos dias mais felizes da minha vida foi quando o capitão chegou e nos falou ‘Soldados, arrumem as coisas. A guerra acabou”, lembra com os olhos rasos de água e a voz trêmula. Voltou para a terra natal, se casou com a mulher que ainda o esperava e, com ela, teve um filho. Um ano e meio após o matrimônio, outra fatalidade: a esposa adoeceu e acabou falecendo. Assim, a tarefa de cuidar do bebê ficou para seu Lírio. Anos depois, incentivado pela família, casou-se novamente. Com a segunda esposa conviveu 55 anos e teve mais oito filhos.

Atualmente, seu Lírio mora sozinho em um lindo lugar. A casa fica em um campo cercado por grandes montanhas. Nos fundos, corre um rio de águas claras. Além de trabalhar na ferraria, ele planta frutas e verduras, cria porcos e galinhas. Nunca fica parado! “Ficar sem trabalhar, para mim, é uma doença. Estou sempre me mexendo”, diz. Todos os dias, recebe visitas dos filhos, noras e netos, rotina que o deixa muito feliz. Dessa forma, o senhor de 97 anos percebe que, apesar de todas as dificuldades enfrentadas, conseguiu formar uma bela família e ser um profissional reconhecido. E, com certeza, a promessa que fez para a mãe há décadas foi cumprida. Isso por que ela deve ter sentido muito orgulho desse filho.

Profissão 3: O alfaiate

Desde cedo é possível ouvir o som inconstante da Vigarelli com mais de meio século de uso. A máquina de costura se tornou companheira de Pedro Paulo Magdalena há trinta anos e continua funcionando perfeitamente. Os intervalos do som que é música aos ouvidos do alfaiate, acontecem à medida que ele vai posicionando a peça de roupa para consertar. Em um dos pulsos, usa uma pulseira com um círculo almofadado onde são espetados alfinetes. O objeto é conhecido como relógio de alfaiate e auxilia no momento de tirar medidas. E falando em medidas... Em momento nenhum Magdalena se separa de uma fita métrica que acomoda no pescoço. Outros instrumentos que caracterizam esse ambiente de trabalho são dedais, régua, ferro de passar e giz de alfaiate.

Entre uma entretela e outra, Magdalena comenta que, embora seu pai trabalhasse na agricultura, incentivava os quatro filhos a aprender outras profissões. Para o agricultor, aquele era um trabalho difícil e que trazia pouco retorno financeiro. Como era cliente da antiga alfaiataria Confecções Piva, conhecia o alfaiate Antônio Halp que, certa vez, comentou sobre a necessidade de pessoas para trabalhar. Animado com a ideia, conversou com Magdalena sobre a oportunidade. Na época, Magdalena tinha 16 anos e cursava o ensino fundamental. Como o estabelecimento ficava a caminho da escola, o jovem começou faltar às aulas para aprender as atividades de um alfaiate.

No início, Magdalena apenas alinhavava entretelas e pregava bolsos nos paletós. Posteriormente, começou a fazer coletes e a cortar mangas. Com o passar dos anos, essas simples funções contribuíram para que seu talento fosse reconhecido e se tornasse sócio das confecções. Ele lembra que, durante o inverno, os pedidos eram tantos que começava a trabalhar às três horas da manhã. Logo em seguida, garante que o esforço valeu a pena, pois a sociedade durou mais de duas décadas. Só terminou porque o senhor Antônio Halp decidiu voltar para sua terra natal, Araranguá. Desde então, Magdalena trabalha em sua própria residência. Tem consciência que o espaço é pequeno, mas, ainda assim, aconchegante.

A todo tempo, o alfaiate demonstra estar preocupado com a organização do local: amontoa os papéis espalhados, repõe as gravatas no suporte, tira o pó do manequim e separa as camisas na prateleira de acordo com as cores. Para evitar um trabalho maior, o espaço do estabelecimento é marcado por uma cortina que separa o resto da casa. Também é impossível não observar as ilustrativas notas de R$100 que foram anexadas à antiga Vigarelli com fita adesiva. Para muitos, elas só revelam o quanto Magdalena é supersticioso, pois a crendice promete contribuir para o sucesso e prosperidade do trabalho. Porém, o profissional vai mais além. Segundo ele, a facilidade de encontrar roupas prontas tem tornado muito difícil a sobrevivência como alfaiate e, nesse caso, toda ajuda é bem-vinda.

Como a produção baixou, Magdalena sentiu necessidade de buscar outras atividades. Passou a trabalhar como radialista e presidente da APAE onde sua esposa é professora. Porém, o que realmente gosta é de ser alfaiate. Para ele, não há nada melhor que cortar calças, paletós e fazer reformas em geral. Tem orgulho desse trabalho e garante qualidade. Por outro lado, lembrar da grande quantidade de alfaiates que havia na cidade lhe aperta o coração, pois hoje é o único. Também não conhece uma pessoa se quer que gostasse de aprender. Mas, de qualquer forma, continua cuidadosamente cortando e recortando tecidos com uma tesoura de ferro que pesa quase 1 kg, presente do saudoso senhor Antônio Halp, a quem sempre será grato.

Profissão 4: O fabricante de rodas d'água

Os olhos azuis de seu Horácio parecem perdidos em um mundo de imagens e lembranças. Claros e brilhantes, deixam transparecer a alegria que o urussanguense sente em poder mostrar o que fez durante décadas. Aos 73 anos, ele reside no bairro Palmeira do Meio e sempre trabalhou com marcenaria. Porém, em dezembro de 2009, sofreu um Acidente Vascular Cerebral (AVC) que, ainda hoje, o impede de exercer o ofício. Os movimentos das mãos foram comprometidos, assim como a fala. Ele tenta conversar, mas não consegue. Tenta articular uma frase, mas é em vão. De repente, seu rosto muda de expressão. Pode-se perceber o esboço de um sorriso que, misturado ao brilho do olhar, traz uma sensação de carinho e compaixão.

Seu Horácio trabalhou em marcenaria desde criança. Com ajuda dos pais e irmãos, fabricava grandes rodas d’água. Como na época não havia energia elétrica, essas rodas eram as responsáveis por mover os moinhos e as atafonas. Geralmente eram construídas próximo dos rios e, como facilitavam o trabalho, tornavam a produção mais rápida. Atualmente não são mais necessárias, o que dificulta encontrar alguém que as faça, mesmo em tamanho menor. Além das rodas, o urussanguense também trabalhava na produção de serras, pilões e outros utensílios para agricultores. Foi através dessas atividades que ele conseguiu sustentar a família, dando tudo quanto ela necessitava para viver bem e com dignidade. É casado com dona Adelaide há 48 anos e, mesmo com os problemas de saúde, parece ser feliz. Está sempre ladeado pela esposa e pelos quatro filhos e seis netos.

Quando se aposentou, há 6 anos, seu Horácio não se acomodou. Como gostava do que fazia, continuou produzindo peças em madeira. “Para não ficar parado, ele resolveu fazer estes objetos, mas em tamanho menor. Vendeu todas as ferramentas que tinha e comprou outras, especiais para a fabricação de miniaturas. Dessa forma, os clientes dele deixaram de ser os donos de serrarias e moinhos e passaram a ser aqueles que gostam de ver a casa ou sítio com uma peça de decoração diferente”, revela dona Adelaide.

Os instrumentos de trabalho se encontram no porão junto de algumas peças inacabadas. Um círculo de aproximadamente um metro de diâmetro fica em um dos cantos. Ele era a base de uma roda d’água que estava sendo fabricada. No mesmo espaço, tábuas e pedaços de madeira parecem estar à espera do profissional que, através de um movimento positivo com a cabeça, garante que ainda irá retornar à atividade. Ao lado, há outras ferramentas em um armário, quadrado e pequeno, preso à parede. Tudo no local foi feito de madeira pelas mãos de seu Horácio. As mesas, a serra-fita, a pica-pau, o pilão, o armário, a roda d’água...

Aos poucos, os movimentos das mãos estão sendo recuperados. No entanto, a fala continua comprometida. Mas não é isso que fará seu Horácio e dona Adelaide perderem a esperança. A mulher acredita piamente na recuperação do marido. Ele, por sua vez, demonstra confiança de que isso realmente vai acontecer. O progresso é lento, mas contínuo. Hoje, o marceneiro já não tem as mãos sujas da serragem. As roupas já não ficam manchadas de óleo e até os calos que possuía, desapareceram. Porém, mantém o mesmo brilho nos olhos e a mesma vontade de viver e trabalhar que tinha que tinha há anos.

Profissão 5: A tocadora de sinos

Terezinha Kamola Costa veio para Urussanga em 1959, quanto tinha apenas oito anos. A família da menina foi desestruturada após o falecimento da mãe. Sem saber o que fazer, seu pai chegou a dar os outros dois irmãos. Mas Kamola foi trazida pela avó que lhe acomodou no antigo orfanato Paraíso da Criança. Essa era a melhor opção para que fosse alimentada e tivesse acesso à educação. Na época, a instituição que foi fundada pelo Monsenhor Agenor Neves Marques, era dirigida por freiras e também funcionava como escola e creche. Quanto às crianças internatas, voltavam para a família assim que alguém assumisse a guarda com condições plenas para tal atitude.

No caso de Kamola, manteve o contato com a família somente enquanto a avó era viva, permanecendo no orfanato durante treze anos. Até que, em 1971, se casou com o mecânico José Lourival Costa, com quem tem três filhos. O fato de constituir família não a afastou do orfanato. Ao contrário, passou a ter um contato maior com as crianças e a ajudar nos eventos. Além disso, em 1978, as freiras deixaram a instituição, o que impossibilitou de continuar funcionando como escola e creche. Dessa forma, Kamola sentiu ainda mais necessidade de manter contato com a casa. Encarou as atividades no orfanato não apenas como seu trabalho, mas como uma forma de gratidão.

Como o Paraíso da Criança era uma instituição católica e que ficava perto da Igreja Matriz Nossa Senhora da Conceição, era comum que seus funcionários se envolvessem com funções religiosas. Os capelões Egídio Desan e Adão Bertió eram os responsáveis pelo toque dos sinos da capela. Porém, chegando a uma idade avançada, perceberam que deveriam ensinar a atividade para uma pessoa mais jovem. Kamola se prontificou a aprender. Desde então, toca diariamente um dos sinos às 6, 12 e 18 horas. Quando falece alguém da cidade, o sino principal é acompanhado por um menor que dá o efeito “repique”, resultando um som mais triste. Porém, em datas festivas, como o natal e a páscoa, conta com a ajuda de uma outra pessoa para que consiga tocar os quatro sinos, transmitindo alegria.

Com a mesma dedicação de trinta anos atrás, Kamola continua sendo a responsável pelo toque dos sinos. Para ela, a atividade consiste em uma forma de comunicação. Argumenta dizendo que, ao contrário de um anúncio no rádio, todos escutam os sinos. Logo, ficam alerta e tentam se informar a respeito do que aconteceu. Quando não tinha Corpo de Bombeiros na cidade, eram os sinos que mobilizavam a sociedade para socorrer pessoas e bens durante os incêndios. Também lembra que, segundo a tradição, o toque dos sinos serve para informar sobre a formação de grandes tempestades e, ao mesmo tempo, abençoar e proteger as pessoas.

Quanto ao antigo orfanato, atualmente é intitulado Casa Lar e acomoda apenas sete crianças. Como não poderia ser diferente, Kamola permanece lá. Diz sentir saudades da algazarra de mais de 45 meninas que moravam ali na sua infância. Ao contrário disso, observa o pátio deserto e o parquinho enferrujado. O limo nas lajotas e as paredes descascadas denunciam a carência do local. Ao invés de cantigas de roda, pode-se ouvir o som de alguns homens trabalhando no telhado para impedir as goteiras. Apesar dessas condições, as responsáveis pela Casa Lar tentam animar o local, de acordo com sua simplicidade. Prova disso é a decoração com fotos de crianças e anjinhos de gesso na parede do refeitório. Kamola diz ainda, que o número de crianças não importa. Ainda que tivesse apenas uma criança, a bondosa tocadora de sinos estaria ali para lhe oferecer assistência e carinho, da mesma maneira que recebeu.

Profissão 6: A reparadora de sombrinhas

Em uma residência localizada no bairro da Estação, parte central de Urussanga, Nália Gamba Ronconi passa o dia trabalhando, fazendo aquilo que tanto gosta. Com habilidade e rapidez, ela conserta sombrinhas, guarda-sóis e guarda-chuvas. A profissão, um tanto quanto diferente, atrai uma grande clientela para a casa de Nália. Encontrar o local é fácil. O ponto de referência é um bar, que fica ao lado. Pintada de azul marinho, parece uma daquelas casinhas desenhadas ainda na infância, com a base quadrada e a parte superior pontiaguda. Os vizinhos, sempre informados pela própria Nália, são os responsáveis por avisar os clientes quando a senhora não está na residência. “Foi passar o fim de semana na praia”, “Foi ao médico com a filha”, ou ainda, “Saiu e não sei a que horas volta”.

A urussanguense tem 69 anos e começou a reparar os objetos há duas décadas. Na época, ela e o esposo eram contratados para trabalhar na roça de fumo de um conhecido. Como as despesas de ir até a lavoura praticamente se igualavam aos lucros, Nália resolveu ficar em casa com os filhos e netos. Percebendo que as dificuldades financeiras só aumentavam, decidiu fazer algo para ajudar na renda familiar. Pegou uma sombrinha quebrada que tinha em casa e a arrumou. Levou quase um dia para terminar o serviço, mas gostou tanto do resultado que foi atrás de outros objetos para consertar. Aos poucos, os vizinhos começaram a trazer sombrinhas para Nália. A mulher ficava cada vez mais experiente no reparo. Descobriu, com o passar do tempo, que existem mais de 10 tipos de varões, e que eles podem ser de alumínio ou plástico. Além disso, dependendo o tamanho da sombrinha, o tecido que a recobre pode ser maior ou menor, da mesma forma o cabo.

Fui fazendo, olhando e arrumando. Aí, descobri que um objeto é diferente do outro. Tem que ser tudo medido com cuidado para depois não sobrar nem faltar pano”, relata a senhora. Desde que começou a trabalhar no conserto dos objetos, o pouco que rende o serviço ajuda na compra de mantimentos. Nália ganha R$2 reais a cada sombrinha pequena arrumada. Já a maior, que dá mais trabalho, lhe rende R$3 reais. Não importa o que foi feito no objeto, o valor sempre é o mesmo. Segundo ela, algumas chegam tão estragadas que, às vezes, a vontade que dá é de jogar do fora. Mas não é isso o que acontece. A mulher se concentra e começa o trabalho. “Tem algumas que os varões estão quebrados, é preciso mudar o tecido e o cabo. Tudo na mesma sombrinha”, diz ela. Nos períodos chuvosos, várias unidades chegam diariamente até às mãos da mulher. Quando o tempo está seco, no entanto, a demanda cai muito.

Além de trazer satisfação, o trabalho também ajuda na renda mensal e na entrada do baile dos idosos. Ir dançar no Centro Social Urbano, no mesmo bairro em que ela mora, é uma diversão, um incentivo ao bom humor que lhe é tão característico. “Ah, como eu gosto de um baile. Fico no salão até fechar a gaita”, declara Nália, com um contagiante sorriso.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Profissão 7: O cachaceiro

Outro profissional que enriquece a cultura de Urussanga é Itálico Dagostin. Disposto a manter a tradição da família, ainda hoje, produz cachaça de maneira artesanal. Para ele, essa é uma forma de lembrar com carinho do velho pai, quem lhe ensinou a atividade há mais de 60 anos. Com tanto tempo de experiência, o homem inspira segurança enquanto fala sobre o assunto. Comenta que a cachaça é uma bebida destilada obtida através da fermentação do caldo de cana. Também destaca que o produto foi sua principal fonte de renda durante décadas. A produção média era de 5000 litros por ano e a maior parte das vendas acontecia no sul do estado.

O alambique fica em uma antiga construção de tijolos à vista. Enquanto Itálico abre as janelas para iluminar o local, é possível ouvir o barulho dos tímidos pingos de pinga. Com humor irreverente e despreocupado com a modéstia, ele garante produzir aguardente da melhor qualidade e pureza. Explica que, antes da destilação, é adicionado água e levedos ao caldo de cana e deixado em repouso por doze horas. Em seguida, esse líquido fermentado é colocado em uma parte do alambique conhecida como caldeira e submetido à alta temperatura. Durante esse processo, o vapor escapa por um cano que passa por dentro de uma caixa com água. Isso faz com que ele esfrie e seja novamente transformado em líquido. Dessa vez, cachaça.

Desde criança, Itálico foi incentivado ao cultivo da cana-de-açúcar. Ele cresceu vendo seus pais plantando, colhendo e moendo cana. Além disso, tinha orgulho dos derivados que a família comercializava: açúcar mascavo, melado e, claro, cachaça! Embora tenha consciência de que a busca por esses produtos diminuiu, o produtor de aguardente ainda mantém a roça de cana. Já não vende cachaça em barril como antigamente, mas vende em litros. Já não transporta para outras cidades, mas oferece aos vizinhos e turistas em um armazém que possui ao lado de casa. “De minha parte, isso aqui não pára enquanto eu estiver aqui na Terra. São, com vida e saúde”, acrescenta.

O prazer e satisfação que Itálico sente ao exercer essa profissão são revelados no armazém. Afinal, como não perceber o cuidado de expor os diversos tipos de licor nas prateleiras? Sejam de flores ou frutas, cada um deles tem sabor marcante. E, estando à mostra, parecem fazer um convite para serem degustados. Já a decoração é rústica, contando com a exposição de objetos e ferramentas que já são considerados relíquias. Ao ser indagado sobre a possibilidade de alguém continuar a atividade, o cachaceiro lamenta, pois acredita que será o último da sua família. “Quem é que vai sair do emprego para estar aqui? Acontecer isso é muito difícil”.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

E falando em inclusão digital...

Câmeras digitais, celulares com diversas funções e acesso facilitado à internet são apenas alguns exemplos do fenômeno que estamos vivendo. A inclusão digital vem transformando nossa sociedade de maneira desenfreada. Em nenhum outro momento da história a informação foi tão valorizada. Basta acessar uma página da web em busca de algum assunto para saturar a mente com informações. Ou ainda, se sentir pequeno e sem possibilidade de assimilar tanto conteúdo. Diante dessas mudanças, é importante que as pessoas de diferentes classes sociais sejam familiarizadas com as mídias digitais.

Apesar da velocidade e abrangência do fenômeno, apenas 41 milhões de brasileiros têm acesso à internet. Ou seja, não corresponde a 25% da população que é composta em média por 190 milhões de pessoas. As escolas deveriam ser as maiores incentivadoras, mas se queixam da precariedade dos equipamentos e da falta de profissionais na área da informática.

A professora Marlei Rodrigues trabalha na Escola Reunida Joaquim Cardoso Duarte, localizada no município de Gravatal, desde 2007. Ela revela que em 2009 os alunos tiveram aulas de informática, mas se tornou inviável continuar o projeto, pois a quantidade de computadores era insuficiente para atender os alunos. “Cada sala de aula possui em média 25 alunos, mas a escola disponibiliza apenas 5 máquinas”, acrescenta.

A professora também diz que não havia internet nas máquinas, o que limitava o aprendizado. Afinal, por mais que inclusão digital não se resuma em internet, não podemos negar que a grande rede tem ligação direta com todas as outras mídias. Podemos observar isso nos vídeos de celular que são veiculados no Youtube, nas fotografias postadas no Orkut, na possibilidade das pessoas publicarem textos sobre diversos assuntos em blogs e interagirem de maneira ainda mais direta através do Twitter ou MSN.

Vale lembrar que inclusão digital não significa disponibilizar computadores e câmeras para a sociedade. É importante que essas pessoas tenham conhecimento sobre o funcionamento dos mesmos. Além disso, que tenham consciência do conteúdo a ser transmitido, de forma que saibam usar de maneira sábia essas ferramentas, colaborando para a própria formação. Preocupados com esse tema, propomos uma campanha de incentivo principalmente às crianças de baixa renda e deficientes físicos.

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Reflexões de um mico solitário

Com olhos brilhantes e pêlos dourados, prosseguia solitário pulando de galho em galho. Olhava para o céu e admirava o bando de aves que voava sobre as árvores. O pobre mico sentia saudade dos velhos amigos, da algazarra que faziam. Não entendia o porquê de sua espécie ser tão perseguida por caçadores e predadores. E se perguntava:
_ Será que sou um mal animal? Ou ainda, um animal mal?
Temia ser o último mico-leão e, dessa forma, estar condenado a viver em solidão. O que faria se soubesse que o futuro de sua espécie é se extinguir na selva para viver de mão em mão? Pois tudo indica que essa forma de vida que era rica em tempos atrás, será sempre lembrada apenas nas notas de vinte reais.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Outra vez, Alice

Depois de construir uma identidade excêntrica com longas-metragens como O estranho mundo de Jack e A noiva cadáver, o renomado diretor Tim Burton aposta no exuberante e confuso mundo de Alice. A nova adaptação da obra de Lewis Carrol estreou nos cinemas brasileiros no último dia 23 e já bate recorde de bilheterias. É um dos primeiros filmes a ser lançado em três dimensões e possui uma identidade visual extremamente apurada. Ora, como admirador de outras produções de Burton, já tinha uma noção do que me aguardava: personagens totalmente fora do comum e cenários com proporções exageradas. Porém, apesar de conhecer os devaneios de Carrol desde a infância, esperava certo amadurecimento da história.

A primeira versão da Disney para Alice no país das maravilhas foi lançada em 1951 sendo alvo de críticas. Os admiradores da obra estranharam a reprodução com seqüências e personagens modificados. Além disso, embora possuísse as impressões digitais do próprio Walt Disney, foi seu primeiro longa-metragem de animação a ser veiculado em TV aberta. Então me pergunto, por que motivo a Disney apostou nessa história novamente? Ou ainda, por que tanta expectativa das platéias?

Sem dúvida, um dos diferenciais está no diretor. Todos vão às salas dos cinemas se perguntando “O que Burton aprontou dessa vez?” Outro ponto alto são os recursos visuais que vêm sendo superados, fazendo dos filmes verdadeiros espetáculos. Como poderia me esquecer de O senhor dos anéis, As crônicas de Nárnia, ou ainda, o recente Avatar? São exemplos de produções em que os efeitos especiais foram fundamentais. Porém, ainda assim, penso que não basta “encher” os olhos. O filme para ser bom deve tocar o coração. Em outras palavras, Burton ficou devendo um roteiro mais criativo, reflexivo e que despertasse o lado crítico de quem assiste.

Confira o clipe da canção Underground com Avril Lavigne:
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À espera de um milagre

Os pré-candidatos à presidência da república já disputam o apoio das igrejas evangélicas. Através de negociações com bispos e pastores, fazem com que haja comprometimento desses líderes durante a campanha. O atual governador do estado de São Paulo, José Serra (PSDB), está investindo na maior igreja evangélica do país, a Assembléia de Deus. Já, a ex-ministra da Casa Civil, Dilma Holsseff (PT), além de cortejar essa denominação, tenta aprofundar suas relações com a Igreja Universal do Reino de Deus. Enquanto isso, a senadora Marina Silva (PV), única evangélica na disputa, encontra dificuldades em receber apoio de seus próprios “irmãos”.

A partir da década de 90, o número de evangélicos começou a crescer de maneira desenfreada. Isso colaborou para a multiplicação de novas denominações. O objetivo principal era que cada um dos fiéis permanecesse na congregação que mais se aproximasse da sua interpretação bíblica, ou ainda, dos seus costumes. Eles deixaram de ser o foco do preconceito religioso e passaram a ocupar cargos notáveis na sociedade. Atualmente, os evangélicos representam 25% do número de eleitores, atraindo olhares de políticos sem o menor sentimento fraterno em relação a eles.

Nada mais comum que políticos telefonando e indo ao encontro do presidente da Convenção Geral da Assembléia de Deus, pastor José Wellington Bezerra da Costa. Afinal, ele tem influência sobre 10 milhões de fiéis. Outra estratégia é caprichar no discurso, focando crença e religião. Reservar momentos para visitar determinadas congregações, de preferência as com maior número de membros, também conta pontos. Porém, os pré-candidatos ainda não refletiram sobre o verdadeiro papel que as igrejas exercem sobre essas pessoas. Nesse caso, cabe aos evangélicos julgar se os púpitos dos templos estão à disposição para fazer campanhas políticas. Até então, todos sabem que o papel dos cultos é contribuir para o equilíbrio espiritual dos seus fiéis. Se perderem essa visão, lhes restará ficar à espera de um milagre.

O príncipe e a arte da guerra

Ao contrário de revistas e jornais que são produzidos em escala industrial para consumo rápido, os livros podem se manter atuais por muito mais tempo. É o que podemos perceber nas obras A arte da guerra de Sun Tzu e O príncipe de Maquiavel. A primeira teve sua versão conhecida no Ocidente em 1772, quando o Padre Amiot traduziu para o francês um texto que trazia as ideias de um filósofo-estrategista chamado Sun Tzu. Já, O Príncipe foi escrito em 1513 e publicado pela primeira vez em 1532. Apesar de antigos, trazem lições de planejamento e estratégias que são perfeitamente aplicáveis ainda hoje em empresas e organizações.

A arte da guerra foi escrito com intuito de preparar um comandante submisso ao príncipe e respeitado pelas tropas. Da mesma forma que o gerente de uma empresa é submisso ao empresário e respeitado pelos demais funcionários. O livro também adverte que, antes de atacar o inimigo, é necessário travar uma batalha consigo mesmo e com suas tropas. Nesse caso, antes de se preocupar em concorrer com outras empresas, o gerente deve conhecer a si próprio e às pessoas que trabalham consigo. Quando a empresa passar por essa fase de autoconhecimento, saberá aproveitar o talento e a capacidade de cada funcionário de maneira individual. “Conquistados por tuas virtudes e tuas capacidades, os oficiais colocados sob tuas ordens te servirão tanto por prazer quanto por dever”.

A partir daí, seguimos para um próximo passo. O comandante deverá tomar conhecimento do terreno no qual vai pisar. Ou melhor, deverá traçar o caminho que pretende seguir e identificar a localização do inimigo. Em outras palavras, devemos conhecer o ramo no qual estamos trabalhando, traçar metas e prestar atenção na reação da concorrência. O autor também ensina a “esconder o jogo”, não mostrar todo o potencial das tropas, de forma que elas possam surpreender seu adversário no momento certo. “Sem ser visto, vê; sem ser ouvido, ouve. Age em silêncio e tem em suas mãos o destino dos inimigos”.

Interessante que, enquanto Sun Tzu incentiva o comandante a manter sua palavra como questão de honra, Maquiavel diz que o príncipe não deve se preocupar em mantê-la. Para ele, “a experiência mostra que só nos nossos tempos fizeram grandes coisas aqueles príncipes que tiveram em pouca conta as promessas feitas e que, com astúcia, souberam transtornar as cabeças dos homens; e, por fim, superaram os que se fundaram na sua lealdade”. Por essas e outras questões que o autor é, muitas vezes, criticado e chamado de Maquiavélico. Por outro lado, devemos sempre levar em conta todo o contexto e não apenas frases isoladas.

Maquiavel também destaca a importância e o cuidado que um príncipe deve ter com suas finanças. Ele explica que o governante não deve levar a fama de gastador e jamais levar o povo à pobreza, cobrando muitos impostos para manter-se rico. Ressalta ainda, que é melhor um príncipe ser temido do que amado, mas não nega que há duas formas de vencer no seu governo: Com as leis ou com a força.

Enfim... Sun Tzu nos traz as táticas bélicas em linguagem simples e agradável, Maquiavel faz uma reflexão sobre as possíveis formas de governo com um vocabulário mais arcaico, o que contribui para uma leitura cansativa. De qualquer forma, ao lermos A arte da guerra, ou ainda, O príncipe, nos sentimos bombardeados com mensagens que têm forte ligação com o dia-a-dia. Porém, Sun Tzu lembra que “há um abismo entre a teoria e a prática” e, sendo assim, devemos ser sábios para utilizar esses conhecimentos também para estabelecer princípios particulares.

Pedalando em busca dos sonhos

Está amanhecendo. Aos poucos a claridade ultrapassa o tecido fino da cortina estampada. O silêncio que acompanhava o solitário tic-tac do despertador é quebrado com o latido dos cães em volta de casa. Então ela abre seu belo par de olhos verdes. Levanta com cuidado, pois não quer perturbar o sono das amigas com quem divide a casa. Ainda descalço, abre a porta da cozinha e caminha em direção à garagem.

Sentindo a brisa que resta da madrugada, recolhe do varal a toalha de banho que foi deixada no dia anterior. A água quente cai sobre os ombros, levando consigo todo o sono. Ainda no banho, observa na parte mais alta da parede, os primeiros raios de sol que ultrapassam o basculante. Então percebe que já passa das 7. Toda aquela tranqüilidade foi pelos ares. Já não importa se amigas dormem, passa o uniforme, limpa os calçados e toma o café da manhã, mesmo que de pé. O trabalho a espera e lá vai ela pedalando, pedalando...

Essa é Janaína Mengue Cardoso, natural de Torres – RS. Em 2007, deixou para trás sua cidade e seus pais para estudar Jornalismo na Universidade do Sul de Santa Catarina – Unisul, onde conseguiu bolsa integral. No momento, a jovem de 23 anos pedala para o laboratório de rádio e TV da mesma universidade, onde trabalha como assistente de edição. E falando em pedalar... Como se esquecer da bicicleta que ganhou de presente dos seus colegas de trabalho? Foi uma grande surpresa e, ao mesmo tempo, um refrigério, pois facilita sua locomoção. Enfim, o deadline está próximo, espero ter transmitido um pouco do perfil dessa menina que se aventura em busca de seus sonhos. Por outro lado, uma mulher que sabe expor suas ideias de maneira clara. Em breve estará retornando ao Rio Grande do Sul, onde pretende atuar nos jornais impressos.

*Atividade Proposta na Disciplina Redação 4 - Texto no Formato Perfil

domingo, 18 de abril de 2010

Simplesmente Gabriela

Apagaram as luzes, mas estávamos com sorte. A noite era clara e o brilho da lua formava uma espécie de penumbra que ultrapassava o basculante entreaberto da cela. Graças a essa meia-luz, conseguia identificar o contorno dos rostos de alguns amigos que, infelizmente, me faziam companhia. Não me pergunte como eram capazes de dormir em uma situação daquelas. Eu, particularmente, estava me consumindo ao tentar encontrar uma explicação para tudo o que aconteceu. Sentada no chão frio de concreto, refletia sobre uma forma de modificar aquela realidade. Sobre as pernas estendidas, acomodava a cabeça de meu amigo Adelcio e lhe acariciava os cabelos. (Gabriela da Silva – 1995)

Desarmei o guarda-chuva e apertei o número de qualquer apartamento no interfone. Uma senhora atende:
_ O que deseja?
_ Boa noite. Você poderia me informar qual o apartamento da Gabi?
_ Gabi? Não conheço, não. Ah! É uma morena?
E eu, que não a via por muito tempo, respondi duvidoso:
_ Sim, essa mesma.
_ Apartamento 103. _ informou a senhora.

Como se não bastassem os calafrios causados pela pouca experiência de um estudante de jornalismo, também tremia com frio naquela noite chuvosa de outono. Liberando a entrada, subi as escadas. Fui bem recebido com um aperto de mãos e um beijo no rosto. Em um dos lados do espaçoso sofá de couro branco, sentei de forma que ficasse de frente para minha entrevistada. Ela estava muito à vontade e me surpreendeu, pois era mais comunicativa do que eu imaginava. Enquanto falava, observava com cuidado seus movimentos. Apesar de ter as unhas pintadas, o tamanho das mãos foi uma das características masculinas que pude perceber na transexual.

Meu objetivo em seu apartamento? Repercutir um fato que ocorreu em meados da década de 90. Não tive acesso ao material veiculado pelo rádio nessa época, mas o jornalismo tradicional divulgaria, mais ou menos, dessa forma: Dois homossexuais foram surpreendidos pela polícia enquanto caminhavam na Avenida Marechal Theodoro na noite passada. As autoridades tomaram tal atitude, pois a comunidade já havia sido informada de que estava proibida a circulação de homossexuais naquele local. Concordo que o texto é claro e objetivo, mas existem muito mais informações nas entrelinhas do que parece.

Ao nascer, Gabriela foi registrada pelos pais com o nome Jesualdo da Silva. Cresceu ao lado de seis irmãos na cidade de Lauro Muller. Como qualquer criança, chorou, sorriu, sentiu medo, enfrentou, pulou corda, sonhou... Porém, havia um diferencial. Bastava rodar a vinheta do programa Cassino do Chacrinha que ela corria para frente da TV. Seus olhinhos brilhavam diante das Chacretes, modelos de perfeição. “Eu quero ser como elas. Eu preciso dançar como elas”. Desejos que ferviam no inocente coração de uma criança. Porém, o tempo se encarrega de nos dar lições. Gabriela percebeu que a vida não é feita só de danças. Segundo ela, para conquistar o respeito da sociedade, teve que estudar muito.

A entrevista prosseguia e, aos poucos, eu ficava com os olhos rasos de água. Não conseguia esconder a admiração por uma pessoa que, embora fosse colocada à margem da sociedade, conseguia ultrapassar seus limites. Já não enxergava somente a Gabriela transexual, mas sim, a Gabriela funcionária pública concursada que trabalha no Centro de Educação de Jovens e Adultos – CEJA. Enfim, estava maravilhado com a sabedoria e convicção de suas palavras. Era o mínimo que eu poderia esperar de alguém com 25 anos de magistério, mas talvez não tivesse levado em conta essa informação.

A entrevistada sabia que o tema da reportagem era violência, mas curtiu falar sobre sua vida pessoal. Acreditava que, dessa forma, pudesse contextualizar os fatos. Para ela, ser detida pela polícia não consistiu em um ato de violência física, mas sim, moral. A violação dos direitos humanos e o abuso de autoridade foram as causas da agressão. “Você não quer só o direito de comer e beber. Você quer ser livre e o ato violento acontece quando isso lhe é negado”. Em alguns casos, a violência moral pode ser ainda mais dolorosa e duradoura que a violência física.

Apesar da avenida ainda movimentada,
ao longe podiam ouvir nossas risadas.
Depois de ficar uma semana toda a trabalhar,
nada melhor que um sábado à noite para sair e dançar.

Sob a imensidão do lindo céu azul marinho,
pontilhado de estrelas, lá íamos nós...
Para os ingênuos, duas santas,
Apesar da aparência atroz.

Gabriela lembra de quando os policiais pararam o carro. Estava junto do amigo Adelcio, também homossexual. Foram revistados e detidos sem apresentar resistência. Em seguida, levados para uma delegacia, onde receberam a informação de que estava proibida a circulação de “pessoas daquele tipo” na Avenida Marechal Theodoro. “Senhor, estávamos apenas caminhando até a danceteria”. _ argumentou Adelcio, mas foi ignorado. “Temos o direito de telefonar para algum familiar”. _ protestou Gabriela, mas não foi ouvida. Naquele mesmo local, havia uma repartição com grade de ferro. Foram encaminhados para lá, onde estavam outros homossexuais.

Gabriela diz que, o objetivo dos policiais era evitar a prostituição e o encontro de travestis, transexuais e gays que vinha acontecendo naquela avenida e causando constrangimento nos moradores. Reconhece que, alguns travestis com quem dividia a cela, foram detidos enquanto se prostituíam. Porém, o que mais restava para eles? “Muitos falam que a prostituição é opcional. Será mesmo? Muitas transexuais partem para essa atividade por que não são aceitas durante o dia. Por que não são vistas como seres humanos capazes de realizar qualquer outra função”.

Nesse momento, fiz uma pausa. Surgiu uma dúvida, mas pensei uma ou duas vezes se deveria pedir esclarecimento. Parecia ignorância de minha parte, mas aprendi na faculdade que “jornalista bom é jornalista burro”. Ou seja, aquele que pergunta, pergunta, pergunta... No meu vocabulário faltaram palavras para formular a questão. Então, quase gaguejando, escapuliu:
_ Qual a diferença entre travesti e transexual?
Para minha surpresa, minha entrevistada não ficou surpresa. Ao contrário, disse que é comum esse tipo de dúvida. Explicou que o travesti é aquele sujeito que se veste como homem no dia-a-dia e como mulher em determinadas ocasiões. Já, as transexuais, incorporam a feminilidade o tempo todo. Retomando o assunto...

Gabriela lembra que, enquanto estava na cela, amigos e familiares tentaram intervir na decisão dos policiais para libertá-la. Eles argumentavam dizendo que os dois detentos tinham saído para dançar e não “fazer programa”, mas não adiantou. Na época, a transexual já era professora e não sabia de que forma justificaria tudo aquilo ao retomar seu trabalho. Por outro lado, se sentia apenas uma das vítimas daquela “caça as bruxas”. Recorda que, nos momentos de tensão, passava um filme em sua cabeça. O elenco era formado pela menina Chacrete, pela professora, pela garota das festas, pela Gabriela e pelo Jesualdo. Ambos se fundiam em uma só pessoa que estava reduzida a cinzas.

Lascava uma unha contra a outra. Outras vezes, tirava o esmalte com o dedão na boca. A ansiedade não permitia que minha perna esquerda se aquietasse, ficava balançando o tempo todo. A única coisa que me confortava era saber que usaria todo aquele preconceito e discriminação a meu favor. A dor só fortalece a velha Fênix, que ressurge das cinzas para voar ainda mais alto. À medida que o dia clareava, rompendo a escuridão daquela cela, eu tinha mais certeza disso. De repente, ouvi passos de alguém que se aproximava. Meus ouvidos também estavam sensíveis para identificar o barulho de um molho de chaves. O policial abriu as grades e chamou um dos meus nomes:
_ Jesualdo da Silva!
Foi um momento de glória para mim. Por que eu sabia que a frieza daquelas paredes não poderia segurar o meu coração que queimava. Naquele momento, eu me erguia para ser ainda mais ousada, para ser uma professora ainda melhor, para me candidatar ao cargo de vereadora daquela cidade e, até mesmo, ser presidenta de uma Ong em defesa aos homossexuais. Eu ainda levantava, quando o policial gritou:
_ Jesualdo da Silva!
Sacudi a poeira de meus pés ao sair daquele lugar. Olhei para os olhos da autoridade e disse:
_ Poupe seu vocabulário, policial. Pode me chamar de, simplesmente... Gabriela.

* Esse texto é uma ficção jornalística. Ou seja, baseado em fatos reais.

quinta-feira, 25 de março de 2010

Avatar: Uma vida termina, outra começa...

Você já imaginou um lugar onde o homem pudesse restabelecer por completo sua ligação com a natureza? Ou ainda, onde fosse possível resgatar o respeito por cada planta, pedra ou criatura? Acredito que esse é o tipo de assunto que lhe faz doer a cabeça. É como se esse ambiente harmonioso estivesse além da sua imaginação. Porém, é exatamente essa a reflexão proposta pela nova produção de James Cameron, Avatar. O longa-metragem vai além do entretenimento, atuando com uma ação transformadora na vida de quem assiste. Faz uma crítica ao relacionamento da humanidade com o meio-ambiente e dá uma lição de respeito às diferenças.

A história se passa no ano 2154, quando o homem constatou que existia um mineral muito valioso em um planeta chamado Pandora. Logo, reuniu numerosos exércitos para desbravar o local. Lá, encontraram os Na’vi, seres racionais com pele azul e mais de três metros de altura, cuja principal missão é preservar a biodiversidade. Na tentativa de se aproximar dos Na’vi, cientistas realizam experimentos com avatares*. Porém, durante esse processo, o ex-fuzileiro Jake Sully passa a respeitar a cultura do povo nativo e se apaixona pela bela Neytiri. Dessa forma, acha injusta a invasão e passa a defender Pandora.

Meses antes da estréia de Avatar, as pessoas já se sentiam bombardeadas com informações nas revistas, nos jornais e, principalmente, na internet. Todos falavam do novo filme de James Cameron, que se proclamara o “rei do mundo” ao receber 11 Oscars por Titanic (1997). A ideia havia surgido há anos, mas o diretor acreditava não existir tecnologia suficiente para concretizá-la com qualidade. Então, trabalhou também no desenvolvimento de câmeras ideais para realizar as gravações. Estima-se que a produção teve custo médio de 500 milhões de dólares, se tornando o longa-metragem mais caro da história do cinema.

Opinião do Crítico

Diferente de tudo o que você já viu. Avatar é daqueles filmes que você assiste no cinema e fica com ele na cabeça durante dias. No início, confesso que apresentei certa resistência. Como levar a sério um roteiro que se passa em outra dimensão? Porém, aos poucos, me aproximei dos Na’vi, passei a respeitar sua cultura e aprendi com eles. Encontrei nos costumes desse povo, valores que não encontramos mais na sociedade em que vivemos. Eles possuem uma relação íntima com a flora e a fauna, o que lhes permite uma ligação direta com os animais, podendo dominá-los sem arrogância.

Vale lembrar que Avatar foi prestigiado por mais de dois bilhões de pessoas, atingindo a maior bilheteria de todos os tempos. Também foi um dos primeiros filmes lançados em três dimensões. Recebeu 9 indicações ao Oscar 2010, mas acabou levando apenas 3 estatuetas: Melhor direção de arte, fotografia e efeitos visuais.
* Qualquer espírito que ocupe um corpo de carne.

Confira o clipe da música I See You, interpretada por Leona Lewis:
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Sessão de fotos:
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domingo, 10 de janeiro de 2010

A princesa e o sapo

Estreou no último 11 de dezembro o 49º longa-metragem de animação da Disney, A Princesa e o Sapo. Inspirados na fábula dos Irmãos Grimm, os diretores John Musker e Ron Clements deram vida a esse fascinante conto de fadas. A dupla de veteranos que já havia trabalhado em O Ratinho Detetive, A Pequena Sereia, Aladdin, Hércules, e Planeta do Tesouro traz de volta as técnicas de animação tradicional, desenhos feitos à mão. O último filme produzido dessa forma foi Nem Que a Vaca Tussa (2004). “A lendária forma de Walt Disney contar suas histórias, seus personagens de sucesso e sua exuberância musical é uma parte essencial do nosso mais novo projeto de animação”, diz o produtor executivo John Lasseter.

A história se passa em Nova Orleans, 1920. Lá, vive uma jovem chamada Tiana que sonha em abrir seu próprio restaurante. Seguindo o exemplo de seus pais, ela trabalha muito para concretizar esse desejo. Porém, aconteceu algo que ela não esperava. Chega à cidade, o príncipe Naveen do reino distante da Maldônia. Surpreendido por um feiticeiro vodu chamado Dr. Facilier, o príncipe é transformado em sapo e a única forma de quebrar o encanto é ganhando o beijo de uma princesa. Desesperado e sem opções, ele implora que Tiana o beije. Mas, como ela não é uma princesa, também é transformada em anfíbio.

Buscando recuperar sua forma humana, Naveen e Tiana partem na missão de encontrar uma velha feiticeira chamada Mama Odie. Enquanto vagam pelos pântanos da Louisiana, fazem grandes amigos. Entre eles, o humilde e apaixonado vaga-lume Ray e o jacaré tocador de trompete, Louis. Outro ponto marcante de A Princesa e o Sapo é o retorno aos clássicos musicais. São sete canções inéditas, compostas pelo premiado compositor Randy Newman. O estilo musical predominante é o jazz.

Opinião do Crítico

Em 1994, a Disney associada aos estúdios Pixar lançou o primeiro longa-metragem de animação produzido totalmente por computador, Toy Story. Diante da unânime aceitação do público, a empresa passou a investir cada vez mais nessa nova técnica a ponto de comprar os estúdios Pixar em 1996. Na época, a única queixa do público era relacionada aos movimentos dos personagens humanos que não pareciam naturais. Com essa deficiência, os novos filmes ficaram limitados a histórias de caráter mais leve, ou ainda, infantil. Afinal, seria desastroso produzir clássicos como O Corcunda de Notre Dame e Pocahontas em 3-D.

A repercussão que A Princesa e o Sapo causou prova que já estávamos com saudades do estilo que consagrou a Disney por mais de 70 anos como a maior produtora de animação. Apostar no trabalho de John Musker e Ron Clements foi uma boa pedida para esse recomeço, mas não o suficiente para resgatar a magia dos grandes clássicos. Apesar dos personagens serem cativantes, faltou romantismo na história e o seguimento musical é pouco atraente. Sem dúvida, o compositor ideal para esse filme seria Alan Menken, premiado por A Pequena Sereia, Aladdin, A Bela e a Fera e Pocahontas. Porém, ele havia trabalhado recentemente em Encantada e os diretores temiam que as produções ficassem parecidas.

O vilão da história, Dr. Facilier, traz as impressões digitais de Musker e Clements. Em alguns momentos, os traços do personagem lembram Jafar, de Aladdin. E, como em outras produções, os diretores não se importaram em expor de maneira explícita o papel do mal. Isso faz com que o filme tenha um caráter sombrio bastante marcante. Outro aspecto que repercutiu foi o fato de o longa-metragem apresentar a primeira princesa negra da Disney, Tiana. Quem se antecipou a dar opinião, fez relação direta com o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. Porém, o filme estava em produção antes mesmo das eleições.

E, como se não bastasse, Tiana vem quebrando outros tabus da realeza. Ao contrário de jovens delicadas e indefesas, como Branca de Neve e Cinderela, Tiana possui um objetivo na vida e trabalha muito para isso. É uma mulher de atitude e toma sábias decisões sem esquecer os valores passados por sua família. Essa personagem é uma forma de homenagear à mulher moderna, pois assume papel competidor com homem no mercado de trabalho sem perder a sensibilidade e o carisma.

De um modo geral os personagens são coloridos e atraentes, mas o relacionamento do vaga-lume Ray e a estrela Evangeline rouba a cena. No início, era uma espécie de amor platônico: Ray admirava a beleza da estrela e apenas sonhava em encontrar aquela vaga-lume de luz tão intensa. Porém, ao ser esmagado pelo Dr. Facilier, o adorável personagem passa a ser mais uma estrela brilhante no céu, se unindo à sua amada para sempre. Esse momento é realmente emocionante, levando até mesmo os adultos às lágrimas. Vale destacar também a melhor amiga de Tiana, Charlote. Ela é responsável por boa parte das piadas ao longo do filme. Por sinal, piadas de muito bom gosto.

Coincidência ou não, A Princesa e o Sapo também dá uma lição de respeito às diferenças. Podemos observar isso no jacaré Louis que sonhava em tocar jazz. Ele vivia frustrado por que aterrorizava as pessoas todas as vezes que tinha a oportunidade de mostrar seu talento. Mas, com o passar do tempo, passou a ser admirado. Afinal, o que seria mais impressionante que um jacaré tocando trompete? Isso prova que as diferenças podem tornar algumas atividades ainda mais interessantes. Uma cena desagradável é quando Tiana em forma de sapo é capturada por caçadores e, em seguida, é resgatada. A seqüência é cansativa e não influencia a história, portanto deveria ser eliminada.
Confira o trailer oficial veiculado no Brasil:
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